segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Deslizamentos na serra do RJ voltarão a ocorrer, diz geólogo

O maior estudo publicado até agora sobre as causas do desastre na serra fluminense, em janeiro deste ano, aponta para a ocorrência simultânea de cinco tipos de deslizamentos deflagrados por chuva torrencial, que provocaram a morte de mais de 900 pessoas. De acordo com o diretor do Departamento de Recursos Minerais do Rio de Janeiro (DRM-RJ), Francisco Dourado, a ocorrência na escala registrada é totalmente nova para os estudos geológicos no País devido à variedade de fenômenos, que vão desde a cheia de rios a deslizamentos em locais íngremes. Apesar disso, segundo o geólogo, situações semelhantes já ocorreram e vão se repetir no futuro.
"Podemos ver marcas de acontecimentos parecidos no passado. Não há como precisar se foram há 100, 500, ou mil anos. Ninguém tem dados suficientes ainda para fazer essa afirmação categórica. Isso só vai poder ser respondido com estudos profundos a serem realizados a partir de agora", afirma. Segundo o geólogo, o fenômeno é inevitável: "vai acontecer novamente, só não sei dizer quando. São processos que ocorrem há milhares de anos. Todas as décadas tem ocorrido, em escalas diferentes".
O estudo, realizado pelo DRM-RJ com a colaboração de geólogos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro e Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), também aponta áreas de risco eminente que deveriam permanecer desabitadas. Dourado explica que cabe às defesas civis dos municípios a interdição dessas regiões. No entanto, o geólogo sugere que os próprios moradores tomem consciência do perigo. "A gente vê pessoas reconstruindo casas que foram destruídas na enchente. As pessoas têm que se conscientizar de que o risco existe. Ainda não temos mapas detalhados, mas a experiência mostra que vai acontecer novamente", afirma.
Chuvas
Um dos responsáveis pelo estudo, o geólogo Cláudio Amaral explica que uma combinação de fatores propiciou a tragédia, mas afirma que as chuvas que a deflagraram também não foram excepcionais. "Os deslizamentos têm causas básicas, efetivas e deflagradoras. Todas se somam para gerar os desastres. As chuvas são deflagradoras. Aqui no Brasil, as causas são sempre chuvas intensas e acumuladas. Essas chuvas são tropicais, mas não têm nada de excepcional", afirma Amaral, que cita desastres em 1979, 1978 e 2002 como decorrência de trombas d'água semelhantes. Um aspecto marcante das chuvas que atingiram a serra em janeiro foi a intensidade em um período de 15 minutos, segundo o estudo.
Ao analisar os dados, Amaral não descarta a intervenção do homem no solo como um dos fatores da tragédia. No entanto, ele ressalta que a maior parte dos deslizamentos ocorreria de qualquer forma. O que evidencia isso, segundo ele, é a ocorrência de escorregamentos em diversos pontos de áreas naturais, não tocadas pelo homem. De acordo com Amaral, a dimensão da tragédia se deu porque havia muitas pessoas em áreas de risco. "Com certeza houve um aumento da população habitando essas áreas. Nos desastres de 1978 e 1979, tínhamos menos pessoas vivendo na serra", afirma.
O geólogo explica que dois fatores foram preponderantes para o desastre: a inclinação do solo, que é naturalmente íngreme naquela região, e a vazão dos rios da serra, que rapidamente se enchem com as chuvas.
Medidas
Diante da iminência de novos deslizamentos, os geólogos são contundentes ao afirmar que a única solução possível para evitar mortes e danos é a prevenção. "Temos uma sequência de estudos que permitem antecipar a ocorrência disso tudo. O problema é que estamos muito atrasados numa cultura de prevenção", afirma Amaral.
Segundo ele, é preciso realizar um mapeamento preciso das áreas de risco em um primeiro momento e, depois, decidir entre obras de contenção ou retirar as pessoas das áreas de risco. Um terceiro passo seria criar um sistema eficaz de alerta, que seja transformado em cultura. "As pessoas cada vez mais ocupam lugares de risco e cada vez têm menos percepção disso. O que tem que ser feito, todo mundo sabe. O problema é executar", afirma.De acordo com Dourado, o DRM-RJ já está providenciando o mapeamento das áreas de risco nas 30 cidades com maior índice de ocorrências (exceto aquelas que já recebem recursos do Ministério da Cidade para isso, como Rio de Janeiro e Niterói). Segundo ele, o primeiro resultado dos estudos já está pronto e passa por análise final dos técnicos do departamento antes de ser publicado e entregue às prefeituras.
"Temos um longo caminho a percorrer em relação à prevenção. Estamos tentando tirar o atraso de décadas. Algumas prefeituras estão correndo atrás, outras não. É preciso cobrar e assumir nossas responsabilidades tanto nas esferas federal, estadual e municipal, quanto como cidadãos", diz.

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